quarta-feira, 19 de junho de 2019

HISTÓRIA NATURAL DOS QUADRÚPEDES

Por ora, admitamos ser possível compor
a história natural dos quadrúpedes, sem,
contudo, esquecer que nada de natural há,
na verdade, na condição, ou melhor dito,
configuração ou desenho ou formatação
daqueles que caminham sobre quatro patas,
e a bem dizer, nem nos que sobre dois pés
se firmam e, por isso, bípedes se chamam.

Não nos esqueçamos, também, mais ainda,
que há entre os nomes e as coisas, entre
correr o leopardo com os olhos fixos e frios
a perseguir a impala, há entre esse movimento
e a tentativa pífia de reter esse fluxo
uma distância infinita, e nós não podemos 
traduzir, sequer, o pavor nos olhos dela;

O que se dirá, então, das cores, do sangue
que congela quando, à noite,  a lua descreve
uma parábola de dor e o leão urra
ainda com o gosto da fêmea percorrendo
o corpo quente, vaso a vaso, veia a veia
e o homem se deita e, perplexo, levanta
novamente, ouvindo uivar ao longe o lobo,
como de dentro de si ouvisse o canto sinistro.

Por ora, admitamos ser possível compor
a história natural dos quadrúpedes, sem
esquecer que ali onde a história começa, 
desfaz-se, para sempre, a própria natureza.
Pintura rupestre na Caverna de Chauvet - França



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