sábado, 9 de setembro de 2017

LAMENTAÇÕES

Aljôfar cristalina em meu rosto, orvalho,
balido do cordeiro ao pé do patíbulo, a
carne a consumir-se antes mesmo do fogo,
desmancha-se desesperada e morta,
enquanto chora a viúva seu pranto febril,
fogo, flama, ouro que se perdeu,
gema preciosa embotado já seu brilho,
honra de suas moças cujas cabeças
inclinam, agora, filhas de Judá,
Jerusalém silenciosa e desfalecida,
lástima e desordem, desprezo e servidão,
morte de uma estrela distante,
noite para sempre de estrelas isenta,
oração que não encontra ouvidos,
por sua própria e ignominiosa vontade,
queda e querer, ver e lembrar, 
Rosa de Sion despetalada,
sou eu quem chora e desatino,
treva a me cobrir os olhos,
unguentos que não me curam,
voragem do vento a varrer o palácio,
xingam-me os meus irmãos,
zombam de mim os meus inimigos.

sábado, 2 de setembro de 2017

AS BODAS DE CANÁ

para Adri Aleixo

O que tenho eu contigo, mulher? 
Trago os pés cansados e cobertos da areia vermelha. 
Há seis talhas de pedra nesta casa, ainda não é a minha hora. 
Para o júbilo, a água, desde as entranhas da terra, 
desde as alturas celestes, 
é mais do que o insípido líquido e sem cor. 
Quem cultiva a vinha antes do lavrador? 
Quem apascenta, antes do pastor, o rebanho? 
O que trazem os teus seios, teus olhos de água? 
O que tenho eu contigo, mulher? 
É chegada a hora da alegria.
Os meus pés se firmam sobre a relva, 
os meus cabelos se cobrem do orvalho. 
Brindem os noivos, os convivas, 
as taças do melhor vinho replenas.