sexta-feira, 7 de junho de 2019

MIRANTE DO VALE

Ocorre, muitas vezes, 
de ir buscar ao que passou, 
a razão ou
a justificação deste tempo presente;
e são
as velharias
as memórias como ladrilhos 
ou pastilhas gastas,
pequenos cacos assentados 
no piso
da antiga casa 
onde morri irreparavelmente,
os lugares onde morreram irmãos 
e amigos,
todos eles mortos sem redenção,
porque não os redime 
nem os traz -
e toda aquela gente -
não os traz o garimpo das pequenas pedras -
ouro que nunca existiu nem brilho -
as pequenas pedras atiradas
no meio de um riacho que secou.
Não fossem as cores lúgubres, 
a paleta escura e terrível de Georg Trakl,
que sentido havia em pisar atônito e bêbado,
crivado o peito de lanças e adagas,
na tua companhia, ou só,
estas emporcalhadas ruas e escuras?
Sabendo à urina, um cheiro de amônia,
esses infernos, essas pocilgas,
a falta de dinheiro, 
a falta de amor, 
Não fosse a melodia ininterrupta e grandiosa,
as arquiteturas de Mozart
e a loucura estampada na face,
mas inerte, 
como uma máscara que usássemos tristes,
não fossem as constelações 
inalcançáveis,
e as prostitutas a gargalhar,
que sentido, pergunto,
nessa insistência estúpida, 
e tu, 
tu me responderias:
esquece.
Robot at the bar no mouth paintig - Burton Gray


 

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