sexta-feira, 18 de setembro de 2015

MIRIAM

Miriam era um nome mágico e o som,
tantas vezes pronunciado baixinho,
como em segredo,
era uma chave da minha imaginação infantil.
Nesse tempo eu era como que o herói ladrão de alguma floresta inglesa,
ou o bravo cavaleiro que pelos campos verdes desfila sua elegância corajosa.
Miriam é o nome do que para mim foi o encontro com a misteriosa coisa
a que chamamos de amor.
O tempo costuma conduzir as coisas para o véu indistinto
do que se perdeu, para a nebulosa região do esquecimento.
O que eu fui quando criança e os tão longínquos sentimentos
que habitavam o meu coração inábil são hoje a tentativa inútil,
a frustrada tentativa de caminhar como quem sonha.
A bicicleta, o sol, o muro da casa, a rua. O vento,
o vestido, a briga na calçada. O futebol, a caixa de sorvetes,
a escola, a chuva. Miriam tinha cabelos negros e curtos;
Miriam vivia em uma casa bem cuidada
e sua mãe cozinhava muito bem.
Amei Miriam em segredo. Apenas gritava-lhe o nome junto a um riacho,
longe de ouvidos humanos, longe do que não fosse mágico,
longe da possibilidade do desencanto. Gritava-lhe o nome
e observava a resposta da água a passar sobre os cascalhos
- a sua palavra fugidia.
Paisagem com dois meninos - João Batista da Costa